8 de janeiro de 2015




                              ALGEMADO

O dia está muito quente. Nosso astro rei, resolveu sair com tudo. Nesta cidade, clima temperado, raras vezes, presenciamos verão tão forte. É muito bom; as pessoas estão mais contentes, nota-se nos sorrisos, no andar, nas roupas, sempre mais refrigeradas. Nos últimos tempos, pela falta de consciência do ser humano; desmatou muito, matou as fontes de água, destruiu o ambiente em sua volta. Pensou só em construir espigões para morar, engaiolar-se, consumir exageradamente. Aí está o resultado; falta de recursos essenciais à vida. Temos um consolo ainda, nesses tempos de calor. As adolescentes, com vestidos curtos, mini shorts, camisetas bem decotadas. Tudo respira felicidade, as conversas são mais longas, os papos duram mais. No Pronto Socorro, aquele ali perto, o central, ambiente abafado, carregado; muitas almas doentes, sempre um motivo, qualquer que pense. Uma perna quebrada, dor de estômago infernal, de cabeça, culpa-se sempre a pressão. Pressão do que?  De que? Uma pressão de todos, tudo da vida, da namorada, do vizinho, família, os outros parentes, circunstantes. Nas escadas do Pronto Socorro, uma cena bucólica, sem importância, ao viandante  despercebido. Um morador de rua, pouco alcolizado, troca ideias, junto a funcionária da limpeza. Uma senhora, origem japonesa, com idade avançada, desce, lentamente, segurando-se no corrimão, uma liberdade inigualável, precisa de ser apreciada. No corredor, os doentes se acotovelam, algo lhes dá uma força; vem de dentro, da vontade, livrar-se do mal, do estorvo, quase descomunal. Alguns coletam sangue, são exames, prontos, com resultados poucas horas depois. Agora me diz: Algemado pode coletar sangue?A posição dos braços, fica irregular para tal finalidade. Tirou as algemas, mas o policial civil estava armado. Havia outro no corredor. 
--- Que falta de liberdade, também roubou, agora está doente!... Disse um sinhorzinho de boa idade. 
--- Que roubo nada; matou uma criança, bem feito, agora está preso! Disse um moço , alto, forte, porte atlético, muito sisudo. 
--- Falta de Deus no coração!... Retrucou uma senhora, com birote nos cabelos.
Afinal, o sujeito tirou sangue, ao lado do policial, sem as algemas, sinais de falsa liberdade. Saiu algemado, sob os olhares dos pacientes, até assustados. Os pacientes, algemados, suas doenças, suas preocupações os prende, escraviza. De alguma forma lhes tira a liberdade, tolhe o seu viver. Não há limites para o pensamento, nem para a liberdade, quando deixamos livre, estaremos sempre mais perto de Deus e de nós mesmos...
Algemados, somos todos nós, pela vida, pelos seres que nos atrelam; compromissos mal assumidos, sonhos de cada dia, vontade ferrenha de viver. Algemas, não podemos nos desvencilhar; são nossos grilhões, também nossa alforria. Linda!... Até no amor, ficamos algemados...  Que fazer?...

Autoria= Gino Marson         08/01/2015      14:25

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